Durante décadas, o pneu suplente foi considerado um componente essencial em qualquer automóvel, proporcionando aos condutores uma solução imediata em caso de furo ou danos nos pneus. Contudo, nos últimos anos, tem-se verificado uma tendência crescente: muitos veículos novos são comercializados sem este equipamento. Esta mudança deve-se a diversos fatores, desde considerações de design e eficiência até à evolução das tecnologias de pneus e estratégias dos fabricantes.​

Redução de Peso e Eficiência Energética

Um dos principais motivos para a eliminação do pneu suplente prende-se com a necessidade de reduzir o peso dos veículos. Um pneu suplente tradicional, juntamente com o macaco e outras ferramentas associadas, pode adicionar entre 15 a 20 kg ao peso total do automóvel.

Ao remover este peso, os fabricantes conseguem melhorar a eficiência energética do veículo, resultando em consumos de combustível mais baixos e, consequentemente, em menores emissões de CO₂. Esta abordagem alinha-se com as rigorosas normas europeias de emissões, que impõem limites cada vez mais restritivos às emissões dos veículos novos.​

Otimização do Espaço e Design Moderno

A evolução do design automóvel tem levado a uma otimização do espaço disponível nos veículos. Com a incorporação de novas tecnologias e equipamentos, como sistemas híbridos, baterias de maior capacidade em veículos elétricos e sistemas avançados de infotainment, o espaço anteriormente destinado ao pneu suplente é agora utilizado para outros fins.

Além disso, a remoção do compartimento do pneu suplente permite aumentar a capacidade da bagageira ou melhorar a disposição dos componentes mecânicos, contribuindo para um design mais eficiente e funcional.​

Alternativas ao Pneu Suplente

Kit de Reparação de Furos, alternativa ao pneu sobressalente
Um kit de emergência de reparação de furos da marca Slime

Face à ausência do pneu suplente, os fabricantes têm adotado várias soluções alternativas para lidar com furos ou danos nos pneus:​

  • Kits de Reparação de Pneus: Estes kits incluem um selante líquido e um compressor de ar, permitindo reparar temporariamente pequenos furos. Embora sejam leves e ocupem pouco espaço, têm limitações significativas. Por exemplo, não são eficazes em rasgos de maior dimensão, danos na lateral do pneu ou quando o pneu está completamente vazio.

    Além disso, a utilização do selante pode inviabilizar a reparação definitiva do pneu, obrigando à sua substituição.
  • Pneus Run-Flat: Desenvolvidos para permitir a continuação da condução mesmo após um furo, os pneus run-flat possuem paredes laterais reforçadas que suportam o peso do veículo sem ar. No entanto, apresentam desvantagens, como um custo mais elevado, menor conforto de condução devido à rigidez e a necessidade de serem substituídos após um determinado número de quilómetros percorridos em modo de emergência.

    Além disso, nem todos os veículos estão preparados para utilizar este tipo de pneus, exigindo sistemas de monitorização da pressão específicos.​
  • Pneus Suplentes Compactos (“Donuts”): São pneus de dimensões reduzidas, concebidos para ocuparem menos espaço e serem mais leves do que um pneu suplente convencional. Destinam-se apenas a utilizações temporárias e a velocidades limitadas, permitindo ao condutor chegar a uma oficina para proceder à reparação ou substituição do pneu danificado.

    Apesar de serem uma solução intermédia, ainda ocupam espaço e adicionam peso ao veículo, razão pela qual muitos fabricantes optam por não os incluir.​

Implicações para os Condutores

Riscos de um pneu furado sem uma alternativa como o pneu suplente

A ausência de um pneu suplente nos veículos modernos tem várias implicações para os condutores:​

  • Dependência da Assistência em Viagem: Sem um pneu suplente, os condutores ficam mais dependentes dos serviços de assistência em viagem em caso de furo. Isto pode resultar em atrasos significativos, especialmente em áreas remotas ou durante viagens longas.

    Em Portugal, a assistência em viagem é uma das coberturas mais acionadas nos seguros automóveis, evidenciando a frequência de situações em que os condutores necessitam de apoio devido a problemas com os pneus.
  • Limitações das Soluções Alternativas: Os kits de reparação e os pneus run-flat oferecem soluções temporárias e nem sempre adequadas a todos os tipos de danos nos pneus. Além disso, a utilização de um kit de reparação pode inviabilizar a reparação definitiva do pneu, obrigando à sua substituição, o que representa um custo adicional para o condutor.​
  • Custos Acrescidos: A substituição de pneus run-flat ou a necessidade de recorrer frequentemente a serviços de assistência podem resultar em despesas adicionais. Além disso, alguns fabricantes oferecem o pneu suplente como um extra opcional, implicando um custo adicional na aquisição do veículo.​

Considerações Legais e Regulamentares

Na União Europeia, não existe uma legislação que obrigue os fabricantes a incluir um pneu suplente nos veículos novos. No entanto, em alguns países, determinados tipos de veículos, como táxis e veículos de transporte de mercadorias, são obrigados a possuir um pneu suplente. Em Portugal, por exemplo, os veículos de transporte de passageiros e mercadorias estão sujeitos a esta obrigatoriedade (taxis, autocarros, camiões, carrinhas de caixa aberta, etc.).

Recomendações para os Condutores

Perante este cenário, é aconselhável que os condutores adotem algumas medidas para se prepararem para eventuais situações de furo ou danos nos pneus:

  • Verificar o Equipamento do Veículo: Ao adquirir um veículo novo, informe-se sobre a presença ou ausência de pneu suplente e as alternativas fornecidas pelo fabricante. Caso o veículo não inclua um pneu suplente, considere a possibilidade de adquirir um como extra ou procurar uma solução compatível com o seu modelo.
  • Conhecer e testar o kit de reparação: Se o seu carro estiver equipado apenas com um kit de reparação, familiarize-se com o seu funcionamento. Ler o manual e fazer um teste simulado pode ser útil — em momentos de stress ou mau tempo, saber como usá-lo rapidamente pode fazer a diferença.
  • Manutenção regular dos pneus: Muitos furos são causados por desgaste excessivo, pressão incorreta ou objetos na estrada. Verifique a pressão dos pneus regularmente, bem como o estado geral do piso e das paredes laterais. Em Portugal, circular com pneus em mau estado pode resultar em coima e reprovação na inspeção periódica obrigatória (IPO).
  • Avaliar o seu tipo de utilização: Condutores que circulam maioritariamente em meio urbano e têm fácil acesso a assistência podem prescindir do pneu suplente. No entanto, quem realiza viagens longas, frequenta zonas rurais ou conduz durante a noite deve ponderar seriamente ter um suplente disponível, mesmo que seja compacto.

Tendência dos fabricantes e futuro do pneu suplente

A Tesla é um dos fabricantes automóveis de veículos elétricos que não fornece pneu suplente

A tendência de eliminar o pneu suplente não mostra sinais de abrandar. Marcas como a Tesla, a Peugeot, a Renault, a Volkswagen e a Toyota já não o incluem na maioria dos seus modelos, a não ser como extra opcional. E mesmo em marcas premium, como BMW ou Mercedes-Benz, a aposta recai cada vez mais em pneus run-flat e kits de reparação.

Esta estratégia está fortemente alinhada com os objetivos europeus de descarbonização, eficiência energética e otimização do design. De acordo com o Regulamento (UE) 2019/631, os fabricantes são penalizados financeiramente se a média de emissões da sua frota ultrapassar os limites definidos — e a eliminação de peso “desnecessário”, como o pneu suplente, é uma das formas de atenuar este risco.

Por outro lado, os veículos elétricos — cada vez mais comuns no mercado europeu — apresentam constrangimentos de espaço e distribuição de peso ainda maiores, o que torna o pneu suplente praticamente impraticável. E com o aumento da conectividade e digitalização dos veículos, muitos fabricantes preferem apostar na integração de serviços de assistência ligados diretamente ao sistema de navegação ou apps da marca.

Conclusão

A ausência de pneu suplente nos automóveis modernos é mais do que uma tendência: é um reflexo da evolução da indústria automóvel. Pesa a necessidade de cumprir metas ambientais, de responder às exigências de design e de apostar em tecnologias mais leves e compactas.

No entanto, a segurança e a preparação continuam a ser responsabilidade do condutor. Perceber as limitações do seu veículo, conhecer as soluções alternativas e tomar medidas preventivas são atitudes essenciais para evitar imprevistos desagradáveis na estrada.

Se o seu carro não tem pneu suplente, talvez esteja na altura de considerar se essa ausência faz sentido para o seu perfil de condução — ou se, por precaução, vale a pena recuperar essa peça “antiga”, mas ainda bastante útil.

Furo na estrada

🔗 Fontes úteis: